A Sociedade Limitada (já falamos sobre ela aqui) é o tipo societário mais adotado no Brasil, por ser uma estrutura simples que separa e blinda o patrimônio pessoal dos seus sócios. Quando este tipo societário é levado para o mundo das Startups, as suas características gerais parecem, inicialmente, incompatíveis com a estrutura de um negócio que tende a ser escalável e obter recursos de terceiros para lograr êxito no crescimento mais rápido que modelos de negócios tradicionais.
Após o ano de 2002 quando tivemos a vigência do novo Código Civil, este trouxe para a Sociedade Limitada a possibilidade de regência supletiva das normas das Sociedades Anônimas (também já falamos sobre aqui), abrindo espaço para a adaptação de instrumentos que podem viabilizar investimentos e melhorar a governança de uma Sociedade Limitada.
Um desses instrumentos são as Quotas em Tesouraria, mas o que seria isso? O que significa dizer que as quotas estão em tesouraria?
Em resumo, dizer que as quotas estão em tesouraria, significa dizer que estas estão em posse da própria sociedade e prontas para serem negociadas.
As Sociedades Limitadas, desde a vigência do Código Civil, já podiam ter quotas em tesouraria, porém isso não poderia acontecer no ato de sua constituição, somente acontecendo diante da saída de um dos sócios, momento pelo qual a Sociedade, com seus próprios recursos, adquiria as quotas do sócio retirante ficando estas em tesouraria.
Em 2017 o DREI (Departamento de Registro Empresarial e Integração) editou a Instrução Normativa 38/2017 que trouxe algumas novidades para a estrutura da Sociedade Limitada sendo uma delas a possibilidade de se ter Quotas em Tesouraria já na constituição da Sociedade Limitada.
Ok! Mas o que isso significa para a minha empresa?
A manutenção de quotas em tesouraria na constituição da empresa facilita a entrada de investidores, que pela utilização do usufruto, podem não necessariamente integrar o corpo social da sociedade e ainda garante aos sócios, presentes no quadro social, sejam investidores ou não, que não tenham a sua porcentagem da sociedade diluída, reduzindo-se o poder de decisão.
Por exemplo
Uma empresa é constituída com 20% das suas quotas em tesouraria: 30% Fundador A, 25% Fundador B, 25%Fundador C e 20% em Tesouraria.
Os sócios poderiam, já em sua constituição ou por meio de alteração contratual, gravar com usufruto a este investidor 10% das quotas em Tesouraria por 1 ano podendo este entrar na sociedade após 1 ano ou receber o investimento com 15% de lucro e ainda receber por meio do usufruto distribuição de dividendos da empresa, se houver. Os outros 10% das quotas em Tesouraria podem ser destinadas a contratos de vesting para entrada de novos sócios na empresa, podendo também serem feitas com usufruto para o recebimento de dividendos.
Imaginado após um ano a entrada na sociedade do Investidor e de 1 novo Sócio para o time com vesting de 5% em 1 ano, ficaria: 30% Fundador A, 25% Fundador B, 25% Fundador C, 10% Investidor, 5% Novo Sócio e 5% em Tesouraria.
Com isso, a entrada de investidores e de sócios para compor o time fica facilitada, evitando a dependência pela cessão dos sócios de suas quotas para a entrada de terceiros na sociedade. Sendo a aprovação feita conforme definida a governança da sociedade, não sendo necessariamente a aprovação de todos os sócios.
Desta forma, a Sociedade Limitada se encaixa cada vez mais no modelo de negócio de uma Startup, podendo ser um tipo societário que fica no meio do caminho em relação a Sociedade Anonima que tem uma estrutura burocrática e custosa para as empresas que estão iniciando.
Entender as possibilidades societárias é importantíssimo para os empreendedores na hora da constituição da empresa, pois ajuda na escolha do profissional correto que conseguirá estruturar a sociedade de acordo com o modelo de negócio da empresa.
Em alguns casos a estruturação engessada de uma sociedade na sua constituição faz com que o desentendimento de um sócio inviabilize a sua alteração, pois para alteração do contrato social o quórum de 3/4 é obrigatório.
É importante lembrar que a utilização deste instrumento em uma Sociedade Limitada necessita de orientação especializada de um contador e de um advogado de confiança. Modelos padrões ou utilizados por outras empresas não são suficientes para utilização de mecanismos societários mais detalhados.